domingo, 13 de outubro de 2013

Cuidado: As calorias enganam



Confiram abaixo trechos da reportagem da Revista Galileu a respeito da interpretação que temos sobre as calorias dos alimentos, estou enviando porque acredito que também acharão super esclarecedora, segue então:

Cuidado: as calorias enganam
O método de calcular a energia dos alimentos caducou. E os pneuzinhos provam que podemos estar consumindo mais do que os rótulos dizem!

No final do século 19, um químico americano descobriu que era possível contar a quantidade de energia dos alimentos . E é por causa dele que, até hoje, somos tentados a dar uma olhada, mesmo que discreta, nas calorias indicadas nos rótulos dos alimentos. Uma colher de Nutella engorda tanto quanto duas de requeijão light. A latinha de cerveja dá na mesma que um copo de suco de laranja.

Feliz com a confirmação de que o mais gostoso vale a pena, você come o doce de avelã, bebe o chope e ainda acredita que está mantendo o peso. Ledo engano. O que os rótulos não dizem (ou preferem não mostrar) é que seu corpo pode digerir cada um desses alimentos de forma muito diferente.

Por isso, modo de preparo, textura, composição ou mesmo dúvidas sobre o método de contagem de calorias são capazes de diminuir ou aumentar a energia extraída da comida em até 50%.
Quando aquele químico, Wilbur Olin Atwater (1844-1907), fez suas contas e descobriu que carboidratos e proteínas geravam 4 quilocalorias (kcal) por grama e gorduras 9 kcal por grama, ele esqueceu de considerar que o corpo humano absorve cada tipo de alimento de forma diferente. 

E que isso pode simplesmente virar de cabeça para baixo esses números que aparecem nas embalagens - e nos quais muita gente baseia cegamente suas dietas.
Um exemplo são as fibras, presentes em cereais e alimentos integrais. Mais resistentes à digestão que outros elementos, as fibras diminuem o tempo que a comida leva para passar pelo intestino. Com menos tempo de trânsito intestinal, os ingredientes também têm menos tempo para ser absorvidos e isso significa que menos calorias são aproveitadas.
 
É aí que aparece Geoffrey Livesey, médico e nutricionista na cidade de Norfolk, Inglaterra. Ele considera, com razão, ultrapassada a metodologia de Atwater, o cara que queimava os alimentos no século 19 enquanto a maioria da população nem sequer sonhava em fazer dieta. Os estudos de Livesey estimam que as fibras são capazes de diminuir em até 25% a energia fornecida pelos alimentos.

Ele diz, por exemplo, que numa dieta com esses ingredientes, as proteínas não geram 4 kcal, mas 3,2 kcal. "Uma pessoa vegetariana, que come mais fibras que a média, absorve as calorias de forma diferente", afirma a nutricionista Helena Simonard Loureiro, da PUC-PR. "Parte dos nutrientes pode passar muito rápido pelo intestino e, se não houver absorção, também não há calorias."

E aí vem a armadilha dos rótulos: entre a cerveja e o suco de laranja, ambos com cerca de 140 kcal por copo, o que tem mais fibras (o suco, e sem açúcar) leva vantagem porque, no final, significa menos calorias no organismo. "No balanço calórico total do dia é importante somar não só os números das etiquetas, mas também esses outros elementos e até mesmo o estado físico do dia, se a pessoa está com intestino preso ou solto, por exemplo."

A regra parece ser uma proporção direta entre menos esforço para comer, mais calorias armazenadas, mais gordura na cintura. Então é sempre bom desconfiar dos rótulos de comidas cozidas ou muito macias. Richard Wrangham, antropólogo da Universidade de Harvard e autor do livro Catching Fire: How Cooking Made Us Human (ainda sem título em português, previsto para ser lançado no Brasil em fevereiro do ano que vem), publicado em maio nos EUA, afirma que o processamento e o cozimento aumentam em muito a energia da comida - em parte porque facilita a digestão.

Wrangham estava preocupado em descobrir como o ato de cozinhar impulsionou a evolução humana. Entre outras coisas, percebeu que os alimentos cozidos deram mais energia aos homens pré-históricos, ajudaram na sobrevivência, na procriação e na estocagem de energia suficiente para fazer o cérebro crescer.

"Na sociedade moderna, os benefícios escondidos desses alimentos cozidos - escondidos porque não são reconhecidos oficialmente pelas embalagens como fornecedores de calorias extras - faz-nos mais gordos", diz Wrangham. "Nossa comida tornou-se ainda mais processada nos últimos cem anos, mas os rótulos continuam estampando o mesmo número de calorias."

Suas experiências indicaram que absorvemos 30% a 50% a mais de energia de um ovo cozido que de um ovo cru e 10% a 50% mais calorias quando comemos alimentos rígidos ou ricos em proteína cozidos. Isso acontece porque cozinhar facilita a quebra de moléculas e de nutrientes pelo organismo. Texturas macias parecem ter o mesmo efeito. "Mesmo quando as calorias são exatamente iguais, as comidas mais moles proporcionam mais ganho de peso", afirma o antropólogo.

A prova é uma experiência com ratos de laboratório alimentados com comida comum e com a mesma comida, mas com a adição de ar. Os ratinhos que comeram a comida mais macia engordaram 30% a mais que os outros. Eles comeram a mesma quantidade de calorias e foram submetidos aos mesmos exercícios físicos. 

A única diferença foi a dificuldade na mastigação e digestão. "Ainda não existem testes para comidas específicas, mas tudo indica que a textura, aliada a diferenças sutis, como o ponto de cozimento das carnes e vegetais (malpassada ou ao ponto), faz com que o número de calorias absorvidas pelo organismo se modifique substancialmente."

Até o grau de maturação das verduras e legumes e a adição de farinhas e açúcares refinados também podem modificar a digestão - e as calorias dos rótulos. Os vegetais verdes dificultam o processo, enquanto os ingredientes refinados ajudam o acúmulo de calorias no organismo. Os carboidratos complexos, como o amido contido na banana verde, necessitam de mais energia para serem digeridos. 

"Já massas, pães e tubérculos bem cozidos, na textura mais agradável ao paladar, são facilmente mastigados, digeridos e convertidos em glicose minutos depois de ingeridos", diz Jaime Amaya Farfan, um dos coordenadores do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação (Nepa), da Universidade de Campinas (Unicamp).

As primeiras tabelas de calorias são invenção americana, já que Olin Atwater, aquele químico que descobriu a quantidade de quilocalorias liberada pelos alimentos, era nova-iorquino. Para poupar trabalho, passamos a usar as tabelas gringas, feitas pelos especialistas americanos, para ditar a composição dos alimentos brasileiros. 

O problema é que nossas frutas têm mais açúcar, nossos vegetais, mais água. E aí a quantidade final de calorias não é a mesma. Isso sem dizer que no cardápio do americano não há farinha de polvilho, coxinha ou feijão-preto.

Mesmo assim, é a partir dessas tabelas que os fabricantes de alimentos estampam o número de calorias no rótulo das embalagens. "Há dois problemas graves com os rótulos: o modo de se calcular as calorias e as tabelas que usamos", afirma Cibele Crispim, nutricionista da RGNutri Consultoria Nutricional. 

Quando uma indústria coloca o número de nutrientes de seu alimento na embalagem, ela não é obrigada a fazer uma análise físico-química no laboratório para descobrir de quantas proteínas, carboidratos e lipídios seu produto é composto - e, a partir daí, dizer o número total de calorias e nutrientes.

A Anvisa estabelece que essa contagem pode ser feita a partir da receita, de acordo com as listas de calorias. E o sistema pode ter erros graves. "No Brasil utilizamos ao menos cinco tabelas para essa contagem, o que pode gerar discrepâncias de até 10% no final", diz a nutricionista.

Desde 1996, o Nepa coordena o projeto da Tabela Brasileira de Composição de Alimentos, programa que tenta evitar as discrepâncias entre as avaliações e descobrir as calorias e nutrientes dos alimentos brasileiros. O governo federal investe no projeto. Vem dando certo: é a lista mais confiável até hoje. "O ideal seria termos uma tabela com os produtos brasileiros e uma análise precisa das receitas. Cozimento, número de fibras e outros elementos alteram o total calórico e nutricional dos alimentos que vai no rótulo", afirma Cibele.

AULA DE MATEMÁTICA

Mas a conclusão foi que o custo de tal sistema não compensaria. Stephen Secor, especialista em fisiologia da digestão na Universidade de Alabama, nos EUA, e estudioso do consumo de energia durante o metabolismo animal, afirma que sempre existirão diferenças entre o que está marcado no rótulo e o que o corpo absorve. 

"As pessoas diferem na quantidade de energia que gastam na digestão e mesmo um novo sistema para quantificar as calorias traria os valores de gastos calóricos para a digestão inexatos. Precisaríamos de muitas experiências para chegar a um número correto", afirma.

Ou seja, uma tabela mostrando a quantidade estimada e a quantidade real de calorias que cada pessoa absorve ainda parece distante. Mas dá para não se deixar enganar pelos valores das embalagens. "Alguém que adora comida crua deve saber que está aproveitando menos calorias que o sugerido no rótulo", afirma Richard Wrangham. "E comidas superprocessadas têm mais calorias que seus equivalentes mais crus."

Além disso, exercícios físicos também proporcionam mudanças importantes na absorção dos nutrientes. "Quando a alimentação é variada e há atividade física, a ingestão calórica se torna menos importante", diz Jaime Farfan. Por enquanto, o problema persiste sem uma solução à vista. 

As tabelas de calorias continuarão a seguir o velho modelo implantado por Atwater no século 19. E ainda bem distantes da realidade.

Fonte: Revista Galileu http://revistagalileu.globo.com

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